Ivete Sangalo canta pagode genérico no álbum e show ‘Clareou’ em conexão artificial com o samba de Clara Nunes

Ivete Sangalo canta alguns pagodes no álbum ao vivo 'Clareou' como se estivesse puxando um trio elétrico Divulgação ♫ OPINIÃO SOBRE ÁLBUM Título: Clare...

Ivete Sangalo canta pagode genérico no álbum e show ‘Clareou’ em conexão artificial com o samba de Clara Nunes
Ivete Sangalo canta pagode genérico no álbum e show ‘Clareou’ em conexão artificial com o samba de Clara Nunes (Foto: Reprodução)

Ivete Sangalo canta alguns pagodes no álbum ao vivo 'Clareou' como se estivesse puxando um trio elétrico Divulgação ♫ OPINIÃO SOBRE ÁLBUM Título: Clareou – Ao vivo no Rio de Janeiro Artista: Ivete Sangalo Cotação: ★ ★ 1/2 ♬ Na introdução de Marechera (Léo Menezes, PC Macabu e Vini Duarte), samba que abre o álbum ao vivo dedicado por Ivete Sangalo ao gênero, a cantora baiana cita nominalmente Clara Nunes (1942 – 1983), Beth Carvalho (1946 – 2019), Clementina de Jesus (1901 – 1987), Candeia (1935 – 1978) e João Nogueira (1941 – 2000) e Jorge Aragão, entre outros bambas do samba do Brasil. A intenção é buscar uma legitimidade para a turnê do show Clareou, já captado em evento fechado no Rio de Janeiro para edição de álbum ao vivo lançado em 17 de outubro com 28 músicas em 17 faixas, com o detalhe de que o anunciado feat com Maria Rita no samba Sem ataque sem defesa (Sombra e Adilson Victor, 1989) não entrou efetivamente no disco por ora. Contudo, a audição do álbum mostra que é artificial o link de Ivete com Clara e com os bambas mencionados. Na sequência de Marechera, a cantora faz interpretações sem alma de Juízo final (Nelson Cavaquinho e Élcio Soares, 1973) e Canto das três raças (Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro, 1976), dois grandes sambas do repertório de Clara. Mas logo depois, na terceira faixa do álbum Clareou – Ao vivo no Rio de Janeiro, vem Mó loucura (Dan Ferreira, Dapaz, Elizeu Henrique e Rodrigo Oliveira), pagode do tipo genérico cantado por Ivete com Dilsinho. Esse samba mais trivial denominado pagode – que nada tem a ver com o pagode semeado no Rio de Janeiro (RJ) nos anos 1970 e 1980 pela geração de bambas do Fundo de Quintal – é o samba dominante no álbum / show de Ivete. Ivete Sangalo se apresenta hoje em Belo Horizonte com turnê de samba Em essência, a turnê Clareou surfa na onda do sucesso dos shows de pagode de nomes como Thiaguinho, Péricles e Ludmilla. Ivete entra nessa roda e, em busca de aval de ídolos do gênero, convida nomes como o próprio Péricles – com quem faz feat no pagode Por inteiro (Samir Trindade, 2025), uma das quatro músicas inéditas do roteiro – e Belo, convidado de Nem precisa responder (Cleitinho Persona, Elizeu Henrique, Rodrigo Oliveira e Samir Trindade, 2025), pagode também inédito, bem ao estilo romântico desse cantor paulista projetado como vocalista do grupo Soweto na década de 1990. É nesse pagode que Ivete transita em Clareou com interpretações sempre abaixo do potencial da cantora, dona de bela voz, geralmente posta em modo automático. Quando celebra o repertório de Benito Di Paula, cantor e compositor que conquistou o Brasil na década de 1970 com samba batucado nas teclas do piano, Ivete ignora a melancolia entranhada nos versos dos sambas-canção Ah, como eu amei (Jota Vellozo e Nei Vellozo, 1981) e Retalhos de cetim (1973), este cantado de forma exteriorizada, com animação nada condizente com a letra, como se Ivete estivesse puxando um trio elétrico. É nesse modus operandi que Ivete divide Loucuras de uma paixão (Alcino Correia – o Ratinho – e Mauro Diniz, 1996) com Jorge Aragão e que traz o reggae Flor do reggae (Ivete Sangalo, Gigi e Fabinho O'Brian, 2004) para o universo do pagode. O álbum termina com a música-título Clareou (Serginho Meriti e Rodrigo Leite, 2014), samba solar ouvido na abertura da novela Três Graças (Globo, 2025) em gravação inédita que junta Thiaguinho e Negra Li. Cantora vocacionada para o palco, pela dose alta de carisma, Ivete Sangalo tem dançado conforme a música do mercado desde que a axé music perdeu o apelo popular. Clareou é mais um disco / show que mostra a cantora atenta aos sinais e em sintonia com as tendências do mercado, atualmente receptivo a grandes turnês de artistas associados ao pagode. Mal nenhum há nisso, mas é preciso dissociar Clareou de Clara Nunes. O samba de Clara, de Candeia, de Beth Carvalho e de João Nogueira é de outra cepa. Capa do álbum ‘Clareou – Ao vivo no Rio de Janeiro’, de Ivete Sangalo Divulgação